segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Algumas observações a respeito das ciências contemporâneas para os Sociólogos – Palestra de 2005

 

 

Gilson Lima

PALESTRA APRESENTADA NO XII Congresso Brasileiro de Sociologia, realizado em Belo Horizonte MG, em junho de 2005.

 

 



É um prazer estar aqui nessa cidade onde nasci e ao mesmo tempo onde nunca morei.  Aqui, nessa cidade - desde o meu nascimento, ficou claro que seria nômade. Nasci aqui e nunca morei aqui. Na verdade, isso foi em 1960. Porém, acabei tornando-me um sedentário desorientado. Mas a tensão entre ficar e querer me mover, me perseguiu durante muito tempo. Resolvi, então, assim: movia-me sempre, mas o mais rápido que podia corria para meu cantinho, meu lugar, meu ninho. Assim foi minha formação nômade e minha carreira de cientista nômade.

Então sociólogos e cientistas do humano. Quando a ciência cartesiana alcança de modo decisivo o mundo do oculto, do não-visual, da informação computável, da comunicação eletromagnética e do infogênese, ela macroparadigmaticamente entra em crise e se deteriora. O próprio Einstein afirmou que o chão escorregou de nossos pés. Então, como testar o conhecimento e fazer ciência sobre o que não se vê? Como testar o conhecimento e fazer ciência sobre o que não se vê? Esse julgamento fica muito visível quando se trabalha a lógica binária computacional deslocando a questão para a maneira como a "linguagem" computável cria relações entre o visível e o invisível.

Assim, em uma sociedade complexa na qual o conhecimento é o fator mais significativo de geração de riqueza, o estudante deve ser remunerado - e bem remunerado também para estudar. Não se trata de política assistencialista, mas de investimento. Investir em conhecimento é o que de mais significativo se pode fazer em uma sociedade complexa.

Aqui acredita-se que se tem um problema significativo. Tomando-se apenas um as¬pecto dessa crise que percorreu todos os campos do conhecimento moderno e conforme foi destacado ao se afirmar que Einstein colocou isso de uma maneira bem clara - e ele entrou em pânico com o problema que tudo está saindo dos olhos, ou seja, tem-se de produzir conhecimento sobre coisas que não se pode mais ver e que o chão escorregou dos pés. A matéria não é mais o lugar onde se pisa. Deve-se reinventar a produção do próprio conhecimento e o modo como se o produz.

Por exemplo: um dia desses, o distribuidor de livros de minha editora deu-me uma carona. Estávamos passando por uma região da cidade de Belo Horizonte que ele denominou de crackolândia (onde se vende e se consome crack), tido como um lugar perigoso e violento. De imediato, ele fechou os vidros do carro. Logo a seguir toca seu telefone celular. Eu lhe disse:

"Ou você não atende ao telefone ou abre um pouco os vidros a fim de que tais espectros eletromagnéticos possam sair e não fiquem incomodando nossas sinapses mentais; não estou a fim de desorganizar minhas interações celulares que já são complexas sozinhas, tentando manter minha identidade de vida e que serão ainda mais perturbadas por esse monte de elétrons que vão incomodá-las com seu receptor de satélite de ondas de alta frequência"

E claro que ainda não se sabe ao certo a efetiva implicação geral do imenso espectro eletromagnético sobre a organização celular, sabe da dança vibracional que ela implica.  É certo que também as grandes empresas não estão interessadas em testes, que são longos e caros, e devem ser feitos em microescala e não na macroescala física. É certo que muitos dos políticos e da justiça pública nem sabem que isso é um problema. Em todo caso, é uma questão a ser discutida em um mundo onde cada vez mais poluição não é apenas o absurdo do veneno que sai dos canos de descarga dos automóveis, dos ônibus, dos caminhões..., mas também, e cada vez mais, poluição eletromagnética.

 Este exemplo traz a questão que muito clara:

qual é o papel de um sociólogo no sentido de construir uma janela onde o senso comum se enxerga em uma nova complexidade do próprio senso comum. Como trazer os múltiplos planos dimensionais da realidade provenientes principalmente do mundo microfísico e nanofísico, para uma escala social que é também múltipla, mas visível no plano macrofísico do tecido social da sociedade simples.

Por exemplo, a nanociência e a nanotecnologia contemplam o universo nanométrico, no qual a dimensão física é representada por uma unidade equivalente a um bilionésimo do metro. Não se trata mais das partículas do universo microfísico, ou seja, do mícron com um milhão de partes iguais de um metro. Trata-se agora do nanômetro, de uma nanopartícula do tamanho de um bilhão de partes iguais de um metro.

Quase tudo que se acha pequeno e invisível que é utilizado pela microeletrônica, inclusive a microeletrônica computacional, opera na escala do mícron, e não do nanômetro, mas, mesmo assim, a emergência da informação computacional tem desafiado todos a enfrentarem dilemas complexos que deixam as pessoas meio atordoadas com suas implicações no mundo organizacional em nossas sociedades.

 Se a microinformação desafia para novas microquestões sociais e para uma efetiva microdemocracia em interconexão complexa com a nossa frágil macrodemocracia, a nanoinformação impele o sujeito a, além disso, enfrentar a nanodemocracia e o impacto de novos acessos à renda não pelos velhos trabalhos industriais, mas pelo próprio conhecimento do conhecimento.

O desafio de uma sociologia que enfrente a complexidade informacional dos diferentes planos dimensionais da realidade é imenso. Por exemplo, tem-se de discutir com os nanobiotecnólogos que os testes da nanopartículas devem ser realizados também, e com muito cuidado, na escala nano. Um elemento químico na escala macrofísica não age da mesma forma na escala nano. O alumínio, por exemplo, que os dentistas utilizam na escala macrofísica para consertar os dentes de seus pacientes, na escala nano, é um explosivo. Assim, as nanopartículas soltas no meio ambiente devem ser testadas e verificados seus riscos também na escala nano.

Igualmente os sociólogos devem disputar a sua participação nos projetos de nanotecnologia desde sua origem. Não se trata de lembrar dos sociólogos apenas depois que os produtos estiverem prontos e chamá-los para convencer a sociedade de que eles não provocam riscos sociais e ambientais. Como afirmou Boaventura, todos os cientistas são sociais e todos os projetos físicos também são projetos sociais, assim como todos os projetos sociais são também físicos.

Não é o que se está verificando nos editais do CNPq, que têm uma verba para projetos-produtos sem a presença, desde a origem, de sociólogos e que têm uma nanoverba para a percepção da nanotecnologia com sociólogos e cientistas sociais de modo muito fragmentado.

A complexidade chegou para revolucionar as concepções de espaço e de tempo. Não havendo simultaneidade universal, o sólido tempo absoluto e o espaço absoluto de Newton deixam de existir. Zygmunt Baumann em consonância com a física quântica fala da modernidade líquida, de uma sociedade sólida que está derretendo e, assim, distribuindo seus sólidos poderes funcionais. É um grande acontecimento, um derretimento das instituições sólidas que envolvem novas conexões e uma nova transubstancialização do poder. Vive-se também uma sociedade cada vez mais simbiogênica que borra suas sólidas fronteiras.

A produção do conhecimento sociológico hoje está permeada, por todos os cantos e de modo intenso por acontecimentos que querem que nos desassosseguemos do sossego funcional dos fatos. Não é a sociologia em si que se desassossega, mas nós, um sociólogo efetivo, um cientista com endereço, um pensador ou um professor com nome e sobrenome. Eu e você que orquestramos também um nós. É cada um que, desassossegando-se de si mesmo, desassossega a sociologia para que eu, você, nós e a sociologia possamos mais intensamente acontecer no mundo.

Pensa-se, por exemplo, que o que aconteceu com os transgênicos é uma experiência que deve ser muito estudada para se para aprender, principalmente, como não fazer essa passagem da relação entre a complexidade e o senso comum e se estar atento também, além dos visíveis interesses mercantis do conhecimento tecnológico, ao papel conservador dos pré-conceitos cientifóbicos. A gente aprende fazendo isso errando, assim como a gente aprende fazendo ciência errando nos experimentos dos laboratórios também.

Então, quer-se chamar atenção para uma questão:

A sociologia que estamos produzindo, também a formação de novos sociólogos está adequada para dar conta de uma tradução e de uma construção, de uma formação e de um diálogo complexo efetivo de facilitação, cooperação e problematização com toda essa emergência que se está construindo, sobretudo a partir da aceleração tecnológica da Segunda Guerra Mundial? Responderia: NÃO!

Vamos enfrentar isso quando pararmos de fazer apenas alguns papers e livros e começarmos a mexer em nossa cultura de ensino-aprendizagem do que se está atualmente trabalhando com o que é ser sociólogo nas atuais sociedades complexas e na estrutura institucional do poder disciplinar em nossas sociedades.

A mesa-redonda que originou este ensaio é uma demonstração de uma aula de sociologia do presente. Isso não significa que se deva desconsiderar nossa tradição, o nosso património clássico e não negociar com a importância do conhecimento reflexivo e enfrentar, não de modo dogmático, os interesses que querem apenas transformar nossas universidades, sobretudo as privadas, em fábricas de procedimentos peritais, que impedem que as pessoas continuem pensando de modo também complexo o mundo social, político e cultural.

Na fase atual de transição paradigmática em que nos encontramos, são já visíveis fortes sinais de um processo de fusão de estilos, de interpenetrações entre cânones e a necessidade de revisitarmos os velhos cânones, verificarmos o que está oculto sob a óptica de novas percepções em emergência. É assim que é possível então dotarmos os velhos clássicos e fundacionistas das ciências sociais de importância.

Apenas um pequeno exemplo do potencial dessa revisitação de nossa tradição clássica sobre o olhar da complexidade. Durkheim, inclusive, integrou a emergente sociologia moderna em uma modesta incursão precoce com a termodinâmica, a bioquímica e a eletricidade, na sua visão de teoria social e de sociedade, que era muito interessante. É o que se vê quando nos deparamos com seu conceito de anomia nas esferas orgânicas e críticas.

Já nascemos, claro, com todos os problemas implicados no positivismo e somos críticos, mas surgimos como área do conhecimento moderno destinada a dialogar com o mundo físico e o mundo social. O primeiro pensador a se destacar neste esforço foi Saint-Simon, muito conhecido por ter fundado a vertente do socialismo utópico de perfil mais tecnocrático. Ele cria a ideia de um novo saber chamado de fisiologia social. Entretanto, é seu discípulo, Augusto Comte (1798-1857), que, após romper com seu mestre, em 1824, pode, de fato, ser considerado o mais importante pioneiro da sociologia. Foi esse homem que inventou a palavra "sociologia". No entanto, Auguste Comte cunhou primeiramente essa recém-criada ciência interessantemente com o nome de "física social".

Outro importante autor pioneiro das ciências sociais que também dialogou com a física e, muito mais precisamente, com o mecanicismo biológico, foi Herbert Spencer (1820-1903). Ele foi o criador de um pensamento social que muito influenciou a sociologia, conhecido como organicismo. Para Spencer, a sociedade assemelha-se a um organismo biológico. Ele desenvolve uma lei geral que diz que as sociedades passam ou passarão por um estado primitivo, caracterizado pela simplicidade e pela estrutura homogénea, para um estado de complexidade crescente, caracterizado pela heterogeneidade progressiva das partes como novos modos de integração. Suas obras mais importantes são: Estudo da sociedade (1873) e Princípios de sociologia (1876).

Também Karl Marx e Emile Durkheim, dois dos mais importantes fundacionistas das ciências sociais, igualmente viajaram com Newton na esteira da física clássica e esperavam descobrir os axiomas e princípios básicos da vida social. O universal maquinismo de relógio converteu-se em modelo, a partir do qual se comparava o Estado com um mecanismo preciso, sujeito a leis, e se retratavam os seres humanos qual máquinas viventes com conexões funcionais de peritagens ou força de trabalho. As leis deterministas da história, de Marx, a teoria da evolução de Darwin, ainda que muito mecânicas e reducionistas diante da cooperação, assim como o modelo "científico" de Freud, que apresentava o ego como um sistema hidráulico, provêm da mesma fonte. Também entre os pioneiros da sociologia moderna encontra-se Vilfredo Pareto que se apoiou abertamente em metáforas mecânicas e térmicas para descrever a dinâmica da sociedade.

Quando Durkheim foi estudar uma sociologia do conhecimento e em suas pesquisas de campo deparou-se com o simbolismo dos totens das tribos australianas apoiou sua explicação do conhecimento na sinergia festiva dessas tribos com a revolução dos elétrons (baseada em concentração e dispersão das festas coletivas, em sua obra Formas elementares da vida religiosa), que é uma ideia central do paradigma da complexidade. A crise da anomia pode ser entendida, então, como a preponderância da dispersão sobre a capacidade de auto-organização, que mais tarde demonstrou Prigogine com sua teoria das estruturas dissipativas.

No entanto, hoje, diferentemente de Durkheim, já se aprende com a complexidade de que o mundo não tem mais uma estrutura implícita. É uma estruturação sem estrutura. É organizado, mas não é dado como organizado.

Outro dos principais fundadores das ciências sociais, Weber, desconfiava explicitamente do trilho mecanicista da velha física. Max Weber teve uma formação académica muito ampla, concentrada em estudos de direito e com profundas incursões pela história, economia, filosofia e mesmo teologia. O que mais nos importa aqui é a ideia de que, para Weber, era necessário descobrir um método que permitisse estabelecer com referência aos fenómenos das atividades humanas, o que o método experimental permitia realizar em relação aos fenómenos da natureza.

Weber defendeu que, em lugar do método experimental, que teria escassa aplicação nos conhecimentos baseados na percepção sensorial, os cientistas sociais, ao lidarem mais claramente com fenómenos subjetivos e da compreensão, tinham necessidade de um novo tipo metódico de mensuração e construção teórica. Weber criou o método que permite lidar com fenómenos de sentido, o método de compreensão, realizado por meio do tipo ideal.

Analisando-se hoje o método compreensivo weberiano, encontra-se uma grande sintonia em Weber, integrada com as preocupações atuais da física quântica que esboça uma reinvenção e uma ênfase numa nova e profunda espiritualidade. Weber estudou também fenómenos como erotismo, teologia e expressou reflexões que oferecem um amplo signi-ficado aos valores. Integrou na ciência preocupações espirituais de modo complexo. Deixou suas lições em seus estudos orientais de que a dimensão espiritual na sociedade não precisa e não deveria se identificar com nenhum grupo particular ou organização particular, tinha que ser pluralista e que os ocidentais deveriam aprender a conviver com multiplici-dade de expressões culturais e espirituais.

Muito próximo das atuais teses do novo paradigma científico defendido pela física quântica, o próprio Weber assinalou que o "motivo" é uma conexão de sentido, que se apresenta como o "fundamento" de uma conduta para o ator ou para o observador. A "causa" é explicada nos seguintes termos: de acordo com uma determinada regra de probabilidade - qualquer que seja o modo de calculá-la e só em casos raros e ideais ela pode ser traduzida segundo absolutos dados mensuráveis, pois a cada um determinado processo (interno ou externo) observado segue-se outro processo determinado (ou aparece junto com ele).

Weber instaura, na sociologia e nas ciências sociais, uma efetiva ruptura com o naturalismo determinista. Para ele, os fenómenos sociais e as atividades humanas são relações sociais, e não coisas; são produtos de sentido e conhecimentos baseados na internalização da percepção sensorial, ou seja, são fundamentalmente fenómenos subjetivos a serem compreendidos.

Não é apenas a física que nos fornece analogias, nós também oferecemos muitas anologias para as ciências ditas "naturais", "duras" ou chamadas equivocadamente de "exatas", como se a exatidão apenas se relacionasse a um monopólio de saber específico (racional) ou há algum tipo de área de conhecimento. A exatidão é um compromisso para qualquer tipo de conhecimento complexo, inclusive humano ou não-humano. Hoje, a própria física aplica muito do que Weber postulou para as ciências sociais como método específico. A intervenção estrutural do sujeito na observação (o encapsulamento entre a dualidade onda e partícula, por exemplo), a questão da indeterminação diante da totalidade sistémica, a complexidade entre o sujeito e o objeto, a busca de uma nova e complexa espiritualidade para além da espiritualidade racionalista e instrumental ocidental... No entanto, para se levar adiante muitas das proposições weberianas será preciso romper com a sua determinação de que na realidade existe um lado, existe um mundo físico, natural com suas leis e, de outro, o mundo cultural, das ciências do espírito com suas complexidades e especificidades. Tem-se que realizar o que Boaventura sintetizou de modo muito preciso como a ideia de que, na complexidade, todas as ciências são sociais. Diria todas as ciências agora são físicas e sociais em similitudes complexas.

Enfim, na sociologia moderna, encontra-se essa ligação mais ou menos explícita desde o pioneiro Augusto Comte e sua intrigante física social, em Herbert Spencer, em Durkheim que, inclusive, integrou a emergente sociologia moderna em uma modesta incursão precoce com a termodinâmica, a bioquímica e a eletricidade e, até mesmo, em Karl Marx. Mesmo em nossa tradição sociológica, o conhecimento físico e o social não estão tão separados como muitas vezes se imagina.

Assim, o que se tem de começar a fazer primeiro é experimentar essa experiência didática de humildade no diálogo. A primeira coisa que um sociólogo que deseja uma sociologia contemporânea do presente tem a fazer é uma sociologia da escuta, do saber ouvir e saber ouvir o outro como outro. Não aquela velha prática do "quando vou conversar com o outro" (aqui uma outra área de conhecimento) tenho apenas que transformar o outro em um pequeno sociólogo, que ele primeiro tem que entender Marx, Durkheim e Weber e, a partir daí, pode-se estabelecer o contato e o diálogo. Nós, sociólogos, temos que aprender a ouvir e a dialogar como pares. Essa questão enfrenta hábitos muito fortes na tradição sociológica. Por exemplo, o sonho de Augusto Comte de que somos a mãe de todas as ciências, o topo da pirâmide do conhecimento. Assim, não dialogamos com a física e nem citamos os físicos em nossas pesquisas por que eles também consideram a sua área de saber como a mãe de todas as ciências. Assim também como os físicos que nos citam são desconsiderados como físicos. Um conflito de édipos.

Isso implica também se começar a ler coisas a que não se está habituado. Entender coisas que não se está habituado a entender. Enfrentar problemas que nos tiram de nossos cómodos sofás de conceitos estabelecidos, os quais, às vezes, estamos desfrutando há mais de 20 anos de comodidade estática.

Por exemplo, uma experiência muito interessante sobre a nanotecnologia foi a do professor Henrique Toma, ele que é um dos maiores e reconhecidos especialistas em nanotecnologia, fez um esforço imenso para traduzir a nanotecnologia na série, inventando o futuro da editora Oficina de Textos.  Por exemplo, um dos problemas principais de comunicação, mesmo binária, entre os softwares é o protocolo. O protocolo é fundamental porque é o modo no qual todos passam a compartilhar o mesmo significado, mesmo sendo diferentes e tendo cada um dos softwares seus protocolos específicos. Imagine-se quantas e quantas as versões desse livrinho chamado O mundo nanométrico foram necessários para o professor Toma traduzir todos os avanços tecnológicos e metodológicos para um protocolo em que se possa entendê-las também na escala macrossocial.

Parece-me que esse é um dos mais significativos papéis da sociologia imersa na complexidade do conhecimento nas sociedades contemporâneas. Não em busca de um protocolo superior, mas como um nódulo complexo que permeia em similitudes as fronteiras, de modo que possamos novamente nos entender diante da surdez da hiperespecialização do saber moderno. Por exemplo, para um sociólogo entender os meandros da nanotecnologia, ele terá de entender e estudar também muito biologia. Para entendermos de informática não precisamos saber programar códigos e instruções binárias, mas temos de saber o que é um algoritmo, como posso transformar em algoritmo um problema social e quais são os potenciais e os limites de uma lógica discreta traduzida em algoritmos ante os fenómenos sociais.

Em Nômades de Pedra: teoria da sociedade simbiogênica[1], meu principal livro, defendo a proposta de uma mova dobra complexa da teoria social envolvida numa sociedade simbiótica, ou seja, preciso um conhecimento teórico e empírico que ligue de modo complexo teorias e empirias, no qual o conceito de simbiogênese constitua-se, sempre, como um transdutor do pensamento e da ação, que converta em symbíon (um fazer e viver junto, sempre), tanto nosso pensar e nosso agir no ecomundo e na complexa vida social. A palavra transdutor define literalmente qualquer dispositivo capaz de converter um tipo de sinal em outro, transformando uma forma de energia em outra. Aqui a ideia de interfaces transdutoras refere-se a essa capacidade de transmudação por meio de mediações.

Encerra-se este artigo com a ideia de que nunca o conhecimento precisou tanto da sociologia e nunca a sociologia foi tão necessária. Físicos não são únicos ao solicitar a presença dos sociólogos na complexidade. Às vezes os físicos têm que fazer o esforço da teoria social e produzir sociologia na ausência contempor^~anea da socielogia presa nas grades da baixa complexidade do Século XIX e no vácuo da complexidade, fazem o quie se tem que fazer sociologia também e isso é também positivo.

A sociologia desempenha um papel fundamental hoje, não para querer novamente ser a mãe de todas as ciências, como Comte e alguns sociólogos ainda pretendem, mas ser um espaço fundamental de um caldo de uma sopa de muitos e diferentes ingredientes, uma sopa de ingredientes muito complexos. Tem-se que aprender com os pré-modernos onde todo o conhecimento tendia a se aproximar em similitudes. Aproximar, cooperar e conflitar, mas dentro de um princípio de similitude.

A sociologia tem condições históricas e acúmulo reflexivo para desempenhar seu papel na complexidade. Talvez diminuir um pouco o peso estrutural da teoria e visitarmos mais experimentos, os laboratórios científicos e termos também nossos pequenos laboratórios de experimentações, pois, como Weber ensinou, é muito complexa a construção dessa tarefa de um redutor da complexidade que não simplifique a complexidade.

Já devíamos estar fazendo muito mais do que estamos fazendo. Porém, já existem também muitos sociólogos e pensadores sociais tanto no Brasil quanto em outros países fazendo isso e com qualidade. Para não cometer injustiça, deixa-se de mencionar algum sociólogo ou cientista social brasileiro, mas, por exemplo, destaca-se o esforço na produção de alguns pensadores sociais e sociólogos que estão dialogando com os mais diferentes campos da ciência, tais como Edgar Morin, que já produziu uma extensa obra, produto de um frutífero diálogo com cientistas de vários saberes; Ulrich Beck, que está permitindo o renascimento renovado de uma sociologia na Europa, com o seu diálogo profundo com a teoria do caos; Zygmunt Bauman que, em diálogo com a física quântica, demonstrou que nossa modernidade é cada vez menos sólida e cada vez mais líquida, além de vários outros autores e sociólogos tanto em nosso país quanto em outros que estão fazendo esse esforço.

Para concluir, uma historinha narrada pelo cientista Otto Neurath que conto em meu livro aqui já citado, adaptada em uma metáfora.

Imaginemo-nos marinheiros em alto mar, viajando nessa embarcação, todos estamos razoavelmente incomodados com nossas cómodas disciplinas e todos sabendo que está acontecendo um processo de aproximação de um enorme maremoto, o qual vai realmente impedir que continuemos nossos cursos de forma tranquila. Nossa engenharia de navegação, da forma como ela foi construída, não dá conta de nos manter seguros. O que temos que fazer. Primeiro não temos agora nessa situação capacidade de ir a algum porto seguro ou terra firme e nos escondermos do tsunami, estamos sozinhos e em alto mar. Nessa situação vamos ter de sentar todos os marinheiros e arrumar uma maneira com os nossos mesmos materiais, com nossas mesmas madeiras, com nosso mesmo barco mudar o próprio barco para enfrentarmos o tsunami.

Essa não é uma missão fácil, mas essa é a missão dos sociólogos e, diria, de todos os cientistas hoje.



[1] LIMA, Gilson. Nómades de pedra: teoria da sociedade simbiogênica contada em prosas. Porto Alegre: Escritos, 2005.


sábado, 10 de outubro de 2020

SIMBIOGÊNESE E A COVID-19: Estamos errados 2 - Transcrição de uma transmissão on line

 

Gilson Lima

TRANSCRIÇÃO  de um fragmento do que está rolando do debate que estou provocando sobre a simbiogênese e a Pandemia da COVID-19.

 


G
ILSON LIMA: Então – Como vimos (demonstrei ados) o problema está no próprio organismo de 12% dos humanos que por algum modo não vivem bem obrigado com o SARS-Cov-2. Mudar o foco desse enfrentamento é essencial até para novas e futuras pandemias.

Não existe mundo sem vírus. São cerca de dez nonilhões de vírus (10 elevado a 31) em nosso planeta. Já a partir de 300 metros das rochas vulcânicas eles já estão lá. Estão nas nuvens, na água do banho, na água que bebemos. Os vírus são as partículas orgânicas mais frequentes nas águas dos oceanos. No nosso corpo tem muito mais vírus e bactérias do que células humanas.

A pergunta chave deveria ser: o acontece com o sistema imune inato que não permite ele se adaptar a regra do equilíbrio em algumas pessoas?

Minha percepção de mundo mudou totalmente quando desde o final dos anos 90, como cientista e, mais recentemente como músico, tenho realizado esforços para difundir e aprimorar uma teoria social da simbiogênese com suas implicações aos múltiplos campos da vida.

Em meu doutorado, a hipótese principal está concentrada em algo que me incomodava muito: a inadequação da visão do cérebro humano pelos cientistas fundadores da informática (fundacionistas). Para mim, esse equívoco levava a uma série de vieses que teriam muitas consequências em todo processo de popularização e industrialização do aceso de massa às máquinas computáveis por empresas, instituições e escolas.

Mergulhei, intensamente, nessa problemática, buscando entender como era reproduzido, pelos primeiros cientistas da computação, a sua ideia de estarem construindo uma máquina que era um: “modelo reduzido do cérebro humano”.

Depois que abandonei a carreira política e assessoria estratégica em políticas públicas, me voltei para a academia e, depois, mais especificamente, para a ciência de bancada.

Entre metodologias informacionais, de um lado, e pesquisa sobre a vida, de outro, me deparei com uma cientista evolucionista norte-americana maravilhosa, Lynn Margulis, uma micro bióloga, que, para mim, é quem mais avançou em decifrar o que é vida na ciência. Diga-se de passagem, a ciência conhece muito pouco sobre a vida. Sabemos muito mais sobre quando a vida se interrompe a morte e como tentar impedi-la em alguns momentos e ou alongá-la para além de sua programação natural, mas sobre vida em si essa energia misteriosa que apossou de um tipo específico de matéria orgânica (molhada) , sabemos muito pouco.

A simbiogênese propõe que a evolução da vida no Planeta acontece em cooperação de longo agora. Quando mais e melhor cooperarem as espécies, mais evoluída elas se tornam.

Resumidamente essa é a gênese da noção dominante das causas das doenças, ou seja, etiologia específica para cada doença. Uma visão militar onde temos um “exército ativo para defesa em atuação constante” e quando eles precisam de ajuda desenvolvemos armas poderosas contra esses invasores inimigos. Claro que as vacinas e os antibióticos são importante, mas o problema é o modelo. Atiramos bombas e matamos aglomerações imensas de amigas (bactérias) e vírus que se aglomeraram na nossa rede biótica para evoluímos junto num longo agora.

PERGUNTA E RÉPLICA: A contribuição de Pasteur para a Saúde humana e animal foi sem precedentes na história. Enquanto os médicos da época ignoravam a existência do mundo vivo microscópico e sua patogenia, e zombavam de Pasteur quanto à recomendação de lavar as mãos, ele não se deixava abater e produzia os primeiros métodos de esterilização que salvava mulheres no parto e pacientes submetidos às cirurgias. A comunidade científicas médica se negava a aceitar (negacionismo), como seres tão pequenos e inferiores aos seres humanos, criados à imagem e semelhança de Deus, poderiam causar algum mal? Mas estes microrganismos, ditos patogênicos, ceifaram inúmeras vidas ao longo da história pré- ciência moderna. 

GILSON LIMA: Sim. Sangrias, explicações mágicas sobre a doença, bruxarias... agora esse é apenas um lado da história.... Em Paris do Século IX a Teoria dos Germes sofreu mesmo forte oposição dessa teoria era Claude Benard era a referência e cheio de discípulos. Ele defendia que o que nos conservava vivo era a harmonia, o equilíbrio, a saúde. Isso era o entendimento dos pré-modernos (dezenas de séculos antes), Está presente e constitui o Corpus hippocraticum (Hipócrates). Para eles a vida se integrava em harmonia com a natureza: as aves se encaixam no ar, os peixes na água, A ideia de imunidade específica da teoria dos vermes de Pasteur onde existe uma causa especifica do adoecimento é contraditória com a ideia de harmonia. Ouvi dizer que Pasteur minoritário escolheu estrategicamente 1878 como data para publicar a Teoria do Germes. Foi o ano da morte de Claude Bernard. Esperou o ele morrer para diminuir a resistência e publicar para não ter uma barreira intransponível para a circulação de sua teoria. Bernard era muito influente e sues discípulos reagiram a tal maneira que alguns chegaram a beber cultura de embrião colhido de casos mortais de cólera para mostrar que não era a bactéria que causava a doença e que se a harmonia do meio interno estivesse preservada você não adoecia.

As coisas são complicadas. Uma pouco mais do que esse dualismo, mas a visão de guerra e do mundo ameaçador cercado de seres invisíveis prontos para nos destruir imperou, sobretudo, quando os alemães isolaram os anticorpos os soros de vacas infectadas por vírus que cometiam a desarmonia do sistema imunológico. As vacinas induzem a criação de anticorpos específicos.  

Ora, sabemos que nem de um lado nem de outro a realidade acontece dessa forma linear e dicotômica. O tema que aqui tratamos revela-nos facetas muito mais complexas da realidade. A visão popular da etiologia das doenças não é monolítica. Ao contrário, sabemos que a vida só é vida por ser simbiogênica, pluralística em evolução cooperativa integrada em causações naturais, emocionais, sobrenaturais e ecológica...

Agora hoje o que está acontecendo com o Corona vírus é que 82% dos que entram em contato com o vírus conserva sua harmonia, são portadores do vírus e chamados de assintomáticos. Grande problema para os epidemiologistas que mesmo sadios continuam a contaminar e irradiar o vírus para os 18% que possuem em desequilíbrio de seu sistema imune com esse agente exógeno, por várias razões – e uma das principais é a genética, mas não só.

PERGUNTA E RÉPLICA: Hoje vejo que a ideia de que os microrganismos atuam em várias das nossas funções, desde o nosso humor, sistema imune, etc., de maneira simbiótica

GILSON LIMA: Hoje a comunidade médica resiste a aceitar a simbiogênese....

PERGUNTA E RÉPLICA: Já foi pior. Os paradigmas vão mudando.

GILSON LIMA:  Foi pior sim, mas mudou muito pouco. Ainda é muito ruim. Muito pouco. Veja o mutirão científico do planeta quase todos os cérebros estão envolvidos e focados no vírus, vacina, etc... A ciência da vida e dos fármacos é antibiótica em essência. Não simbióticas. Na politica publica saúde é doença (hospitais, etc..). O Ministério da Saúde seria o da Agricultura, da indústria de alimentos, de atividades físicas. Tá de cabeça para baixo.

PERGUNTA E RÉPLICA: Só que a natureza é repleta de exemplos de corrida armamentista (termo do militarismo mesmo, queria analogia melhor para a linguagem humana, mas não acho). Podemos focar nas flores, mas não negar os espinhos. E podemos, por meio da nossa consciência, não permitir que esses mecanismos naturais reagem nossas sociedades.

GILSON LIMA: Para a simbiogenese não. Como disse nosso sistema imune e nosso organismo é uma maravilhosa máquina da paz. Os humanos com um sistema imune inato evoluído que convivem em paz com esse vírus 82% são chamados de assintomáticos. Não estão estudando muito o porque os outros se desequilibram. Quem mata não é o vírus é o próprio sistema imune desequilibrado. Isso está demonstrado desde 2002  nos COVID-19 na China. Mas o paradigma não permite ver isso. Só o vírus como agente inimigo.

PERGUNTA E RÉPLICA: Antibióticos e vacinas salvam vidas. A lógica de que se deve ser simbiótico ou antibiótico é a lógica binária de 1 bit. Dualismo? A Física nos abre para a possibilidade da lógica do terceiro incluído, a computação também. Espero que você não seja contra antibióticos de um dia precisar. Por desejar seu bem.

GILSON LIMA: Como último recurso. 0,0002% das bactérias são mortais. Algumas ficam piores por causa dos próprios antibióticos. As piores estão concentradas em hospitais (saúde ???). Vão até lá  por dores de cabeça em emergência.

PERGUNTA E RÉPLICA: Tem muita gente estudando os assintomáticos. Tem gente virando dia e noite, trabalhando de domingo a domingo, amigos meus inclusive, buscando entender a resposta imune de uns, porque não essa doença ainda "misteriosa" é totalmente dependente do indivíduo, como ele responde.

GILSON LIMA: Infelizmente ainda com o mesmo paradigma dominante. Tenho acompanhado muito a produção. Está tudo alI. Só não enxergam. A tempestade de citicinas que mata. Hoje quando um caso grave entra no Hospital  já se pode saber - se souberem mensurar exames -    quem vai lá adiante precisar de respirador e quem não vai.  Mas é um diálogo com surdos nas UTIs.

PERGUNTA E DEBATE: A natureza não está ligando para os termos que queremos dar a ela, se a resposta é de paz ou de guerra, pois guerra e paz só faz sentido para nós, nossa cultura, nossa história. Antropomorfizamos a natureza, como se eles gostasse de Dostoiévski, ou a chamamos de bela, quando a beleza é um atributo do qualia neurofisiológico humano. Acho essa ideia fora de proporção. Como um Cosmos deste tamanho estaria centrado na Terra? Acho fora de proporção.

GILSON LIMA: Não existe uma ordem dada na natureza e nem um caos determinístico. Ilya Prigogine. A ordem está dentro da desordem e a desordem está dentro da ordem. É processo permanente de auto-organização e a evolução - de longo agora - está demonstrado - é cooperação, paz. Quando - na exceção da guerra a vida,  uma rede biótica complexa como a nossa é  atacada por um agente da morte - "vence"  quem coopera mais em evolução. Muitos retrovírus são incorporados e viram fragmentos de DNA, a maioria deles são incorporados na rede biótica para uma cooperação de longo agora.  Retorna o equilíbrio.A

PERGUNTA E RÉPLICA: Nelson tem um trabalho profundo sobre o que Gilson vem trazendo na imunologia. Acho que leciona hoje senão me engano em cadeira na UFMG.

GILSON LIMA: Recém me apresentaram. Fazem duas semanas  ele. que me apresentaram ele. Queria ter conhecido antes. Ele - mesmo não explicitando - é simbiogênico... OS HEREGES SE CONECTAM. Acho que como eu já está aposentado da academia. Mas incrível além de Maturana alguém da biologia e da imunidade pensar assim. E ele mudou não pela teoria, mas por verificação de bancada. Tive acesso a uma material do Nelson Vaz de 2008, dois anos antes de minha palestra no Seminário Internacional de Nanotecnologia na Fio Cruz que apresentei pela primeira  vez a simbiogênese em minhas pesquisas de neuroreabilitação. No material dele vi que até os exemplos do contexto do surgimento da teria dos vermes e alguns outros exemplos são praticamente os mesmos. Nunca tinha ouvido falar dele. Uma pena que não o conheci antes. Mas antes tarde do que nunca. É engraçado como os hereges se conectam em momentos de transição paradigmática.




RÉPLICA E PERGUNTA: Vale conferir o conceito de o conceito de autopoiesis de Maturana acho que é que traz mais luz no assunto.

GILSON LIMA: Aqui começo a divergência. Nesse caso - sobre a vida - o Humberto Maturana e o Nelson Vaz entraram numa canoa furada. Os sistemistas como Niklas Luhmann e sua teoria dos sistemas (autopoiéticos) para a sociedade pioraram ainda mais e afundaram o barco de vez.

GILSON LIMA: Tenho que terminar. Estou finalizando um capítulo longo que conta minha história com a simbiogenese de onde vim e onde cheguei.... Meu sonho é que ela ganhe o mundo, as ciências da vida, da sociedade, etc...  Sou otimista. O vírus atual dessa pandemia está nos ajudando. Assim que puder disponibilizo a todos.

terça-feira, 6 de outubro de 2020

DENGUE =》 QUEM DISSE QUE O MOSQUITO É O PROBLEMA? Viva a simbiogênese


Gilson Lima

Uma notícia ótima. Está dando certo. Fiz uma palestra numa Conferência Internacional de nanotecnologia coordenado pela Fio Cruz e realizado no Hotel Sofitel - RJ em novembro de 2010. O título de minha palestra em defesa da simbiogênese era: Reinventando o Universo do Humano com a Ciência em Ação. Parte dessa palestra está disponpível aqui no link http://glolima.blogspot.com/2010/11/encontro-com-daniel-dennet-reinventando_28.html 

Tinha muitos estrangeiros - lá céticos com o tema que trouxe, mas encontrei uma turma de herege lá na própria Fundação que adotou a ideia.

A boa notícia é que a simbiogenese vive lá. Essa turma tem os hereges que produziram um experimento anti-vacina para a Zica e que está sendo muito bom. Utilizam o método Método Wolbachia em Yogyakarta, Indonésia. Colocam uma bactéria num mosquito e eles ficam inofensivos para nós. Pensei até em colocar no grupo da complexidade do watts (acho que estamos todos lá né?). Consiste na liberação de Aedes aegypti com Wolbachia (bactéria) para que se reproduzam com os Aedes aegypti locais e estabelecer uma nova população destes mosquitos. A Wolbachia é um microrganismo intracelular presente em 60% dos insetos da natureza, mas que não estava presente no Aedes aegypti. Quando presente nestes mosquitos, ela impede que os vírus da dengue, zika, chikungunya e febre amarela se desenvolvam dentro do mosquito, contribuindo para redução destas doenças. Uma vez que os mosquitos com Wolbachia são liberados no ambiente, eles se reproduzem com mosquitos de campo e ajudam a criar uma nova geração de mosquitos com Wolbachia..

domingo, 4 de outubro de 2020

ESTAMOS ERRADOS: a chave do problema da COVID-19 é o sistema imune

Gilson Lima 1

Gostaria de compartilhar com vocês uma questão que julgo ser chave para o enfrentamento da pandemia. Pediria mais especificamente a ajuda no debate com os bioquímicos, microbiologistas e especialistas em sistema imune humano e, se possível, o contato com os cientistas das principais bancadas de enfrentamento ao SAR-COV-2.


Isso aconteceu depois de alguns meses pesquisando sobre artigos científicos envolvendo a família dos corona vírus que conhecemos mais detidamente a partir de 2002 (estudos chineses). 

Verificando estudos sobre óbitos e situações de agravamento dos simtomas da COVID-19 me inclinei fortemente a considerar que nossos esforços – desse mutirão científico planetário jamais visto nessa em escala - estão concentrados  no vírus e fora do centro de atividade principal da doença.

Estar focado no vírus –  é bom – vacinas , etc., mas não creio que o vírus deva ser o centro de atividade de nossos esforços mais imediatos respostas aos casos graves e os óbitos.

 O centro de Atividade da COVID-19 não é o vírus. O segredo da derrota da doença está em nós mesmos. A Chave é o sistema imune. O que está matando os humanos hoje é nosso próprio sistema imunológico, não tanto o vírus em si

O vírus produz um determinado quadro, que impõe, para alguns de nós, um sttess ao sistema imunológico um stress.  Uma super reação desorganizada. O sistema imunológico, ao super reagir, está causando as mortes.

Isso não pareceria uma grande novidade se lêssemos com outros olhos muitas das pesquisas realizadas. Está presente de modo fragmentado em muitas delas. Falta é ligar o problema como centro da atividade. O que não se encontra presente é esse olhar de que o centro do problema vital pode estar no nosso sistema imunológico. 

Não se sabe ainda por certo o porquê a passagem  em alguns casos dos sintomas leves para os graves e que podem gerar até óbitos. Sabe-se que morremos por uma reação exagerada de nossas defesas que pode acontecer em algumas pessoas.

Para entender como os indivíduos adquirem imunidade a um agente viral é preciso compreender o processo de resposta imune aos patógenos. A partir de estratégias de reconhecimento, o organismo identifica tais agentes por estruturas que são compartilhadas por vários deles, conhecidos por padrões moleculares associados aos patógenos, PMAPs (no inglês PAMPs: Pathogens-Associated Molecular Pattern), e, por conseguinte deflagra respostas a fim de conter aquele contato inoportuno, o qual pode quebrar seu equilíbrio (homeostase). Assim, diz-se que o sistema imune foi ativado.

A primeira estratégia de resposta aos agentes infecciosos é a imunidade inata. Como se trata de um vírus novo, nosso sistema imunológico não tem memória para combate-lo vai depender totalmente de nosso sistema inato que é composto por barreiras físicas corporais, substâncias químicas com ação inibitória e células especializadas capazes de identificar e neutralizar potenciais agentes de infecções, de forma generalizada e não específico.

Uma questão que parece certa é que explica as oscilações de contágio é a quantidade de vírus com a qual o nosso organismo tem contato: a carga viral. Quando menor a quantidade, mais fácil será se livrar dele no início. A insistência de entrada do vírus, gerando cada vez uma maior quantidade deles – permite que ele ultrapasse a fronteira inicial. 

A nossa resposta inata (primeira linha de defesa do organismo) já atacaria o vírus facilmente.  Quando recebemos uma alta carga viral, o que acontece principalmente para os profissionais de saúde, já seria mais difícil de conter.

A genética

Uma outra questão importante é o DNA que difere normalmente de indivíduo para indivíduo. Se seu código genético for "premiado" com uma alteração que facilite a entrada dos vírus nas células, as chances de desenvolver um quadro grave da covid-19 seria bem maior.

Estudando detalhadamente o porquê de jovens saudáveis morrerem, verificaram-se muitas novidades. Uma delas é que o gene e imunidade podem ajudar a explicar que o vírus pode estar matando as pessoas muito mais pela reação do nosso próprio sistema imunológico do que pela sua letalidade.

Viu-se em algumas pesquisas que as alterações no metabolismo causadas pelas doenças indicadas como grupo de risco verificou-se o desencadeamento de uma série de eventos bioquímicos que levam a um aumento na expressão do gene ACE-2, responsável por codificar uma proteína à qual o vírus se conecta para infectar as células. O gene ACE-2, funciona como um receptor molecular tem sido a porta de entrada do vírus que também indica uma explicação de por que ocorrem casos graves.

Quando o vírus é internalizado na célula — o que pode ocorrer com maior facilidade para quem tem a alteração no gene — consegue se reproduzir rapidamente e infectar outras células.

Isso explica muita coisa. Quando várias células já estão infectadas, nosso próprio sistema imunológico, que serve para  nos proteger contra vírus e bactérias, pode oferecer risco. O novo coronavírus (SARS-CoV-2) pode infectar algumas das células de defesa e fazer com que elas entrem uma luta desproporcional no organismo. Confusos com a infecção do vírus, neutrófilos e linfócitos T citotóxicos, importantes células de defesa, podem entrar em atividade exaltada, combatendo tanto o inimigo quanto outras células saudáveis — prejudicando a defesa e causando danos a tecidos saudáveis.

Segundo alguns estudos essa análise pode ser detectada verificando um conjunto de apenas 13 genes envolvidos na imunidade à interferon, uma proteína produzida por leucócitos e fibroblastos para impedir a replicação de vírus. Com a presença da infecção viral no organismo, a proteína alerta o sistema imunológico, que combate a doença.

Isso pode mudar tudo, inclusive o esforço de combate ao vírus pelas vacinas. A boa notícia é que bloquear a atuação destrutiva do sistema imunológico pode ser mais fácil, mais rápido e bem mais barato.

Bloquear a entrada do vírus e mantê-lo encapsulado apenas na circulação sanguínea, permitirá que o sistema imunológico consiga reconhecê-lo e combatê-lo tranquilamente, sem desencadear o estresse e uma reação exagerada do sistema imunológico . Essa seria a chave do enfrentamento para evitarmos os casos graves enquanto lutamos para encontrar uma vacina adequada.


1. Gilson Lima. É cientista aposentado depois de décadas de atuação independente sobre múltiplos campos da vida e da tecnologia na complexidade. Criou a teoria não natural da simbiogênese cooperativa na evolução cérebro, máquinas, corpos e sociedade. Foi por vários anos pesquisador acadêmico e industrial coordenando bancadas de pesquisas de ciência de ponta, tecnologia e protocolos de neuroreabilitação em diferentes cidades e diferentes países principalmente, europeus.

Tem formação original humanística e foi voltando seus estudos e pesquisas desde o início dos anos 90 para a abordagem da complexidade nas metodologias informacionais, depois na nanotecnologia e nos últimos 15 anos de carreira focou na neuroaprendizagem e reabilitação envolvendo a simbiogênese e interfaces colaborativas entre cérebro, corpos e displays.

Inventor de várias tecnologias, softwares e protocolos clínicos.

Escritor. Muitas de suas atividades e textos estão disponíveis no blog: http://glolima.blogspot.com

Atualmente retomou sua atividade como músico compositor, cantor que atuava na adolescência produzindo atualmente suas canções e coordenando a Banda Seu Kowalsky e os Nômades de Pedra. Suas músicas e shows vídeos podem ser acessadas no canal do youtube. https://www.youtube.com/c/seukowalskyeosnomadesdepedra

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

As três regras que regem as epidemias

 Gilson Lima


Encontrar o centro de atividade das redes epidêmicas é encontrar o que Malcolm Gladwel definiu: o ponto de desequilíbrio. O ponto da virada. É preciso estar atento as pequenas coisas que podem fazer grande diferença.




Esse texto trata-se de uma apresentação aplicada das três regras de mudança que manifestam uma epidemia que Malcolm Gladwell, chamou de: 1. A Regra dos Eleitos; 2. O Fator de Fixação e 3. O Poder do Contexto.

Um parêntese inicial. Então. Pediram para exemplificar a questão do centro de atividade na mineração de dados numa rede. Então vai um exemplo, bem conhecido e que vem muito a calhar nos tempos atuais.                                                                                  

É preciso entender que é no centro de Atividade da Rede que se localizará: O PONTO DA VIRADA OU DO DESEQUILÍBRIO. (Aquela menor diferença que faz toda a diferença).

Vamos “imaginar” um surto do SARS-COV-2. Suponha que, no verão próximo ao final do ano, mil turistas norte-americanos cheguem ao Rio de Janeiro contaminados e com a COVID-19. Vamos imaginar um ciclo de 24 horas.

Digamos que o índice de infecção desse vírus é de 2%, o que quer dizer que uma em cada 50 pessoas que têm contato com um portador do vírus fica doente e ou mesmo que muitos estejam assintomáticos não deixam de ser vetores de contaminação.

Digamos que esse seja exatamente o número de pessoas com quem um carioca médio – nas viagens de metrô e na convivência com os colegas de trabalho – entra em contato todos os dias. 50 pessoas por dia.

O que temos, então, é uma doença em equilíbrio. Os mil turistas americanos transmitem o vírus para mil indivíduos no dia da chegada. No dia seguinte, essas mil pessoas recém-infectadas passam o vírus para mais outras mil; mas, ao mesmo tempo, os mil turistas que iniciaram a epidemia estão recuperando a saúde. Com o equilíbrio entre os que estão adoecendo e os que estão se curando, a doença segue num ritmo constante, porém discreto durante todo o verão e o outono.

No entanto, logo ali adiante aproximam-se as festas de fim de ano. O bairro de Copacabana do Rio estará tomado de gente para ver os fogos. Metrôs e ônibus ficam apinhados de turistas e de pessoas indo às compras. Agora, em vez de ter contato com 50 indivíduos por dia, o morador de Copacabana agora se vê diante de, digamos, 55 pessoas por dia.

De repente, o equilíbrio se desfaz. Os mil portadores do vírus passam a se encontrar com 55 mil pessoas diariamente, e o índice de infecção é de 2%. Isso significa que haverá 1.100 novos casos da doença no dia seguinte. Esses 1.100, por sua vez, estão agora transmitindo o vírus a 55 mil pessoas também, de forma que no terceiro dia haverá 1.210 moradores de Ipanema gripados; no quarto dia, serão 1.331; e, no fim da semana, quase 2 mil, e assim por diante, subindo numa espiral exponencial até que O Rio de janeiro esteja em meio a uma epidemia de COVID-19 a todo vapor em 25 de dezembro.

Aquele momento em que o portador médio do vírus da COVID-19, que antes tinha contato com 50 pessoas por dia, passou a se encontrar com 55 indivíduos diariamente foi o Ponto da Virada ou o Ponto de Desequilíbrio. Esse é o onde se situa o centro de atividades da rede de contaminação desse vírus. Que gera sua força oi pode gerar sua fraqueza para combatê-lo.

 Significou o patamar em que um fenômeno comum e estável – um surto moderado da doença – transformou-se numa crise de saúde pública. Num gráfico de representação de grafos e vértices, nesse caso, seria aquele onde a linha de repente dá uma engrossada fora do comum em suas linhas de conexão.

Os Pontos da Virada e de desequilíbrio são momentos de grande sensibilidade. Mudanças feitas exatamente nesses momentos decisivos podem ter consequências enormes. A SAR-COV-2 se tornou uma epidemia quando o número de cariocas em contato com um portador do vírus da doença pulou de 50 para 55 por dia. Contudo, se essa pequena mudança (essa pequena diferença faz toda a diferença) e se tivesse acontecido na direção oposta – caso o número tivesse caído de 50 para 45 numa semana, por exemplo –, essa alteração teria empurrado a quantidade de vítimas da doença para 478 numa semana. E, com mais algumas semanas nesse patamar, a COVID-19 levada pelos americanos teria desaparecido totalmente do Rio de janeiro.

Cortar o número de expostos de 70 para 65, de 65 para 60 ou de 60 para 55 não teria sido suficiente para acabar com a epidemia. Mas uma mudança bem no Ponto da Virada, de 50 para 45, teria.

As epidemias envolvem a ação das pessoas que transmitem agentes infecciosos, do agente infeccioso em si e do ambiente em que o agente atua. Segundo Malcolm Gladwell, como dissemos, existem três agentes vitais de mudança que manifestam uma epidemia, o que ele chamou de: 1. A Regra dos Eleitos; 2. O Fator de Fixação e 3. O Poder do Contexto.

 

1. A Regra dos Eleitos

Os eleitos indicam que em determinados processos, como o de uma pandemia,  tratar todas os agentes como iguais  pode se tornar um desastre. Alguns  economistas chamaram esse fenômenos de o princípio 80/20[1].

 Trata-se da ideia de que, para eles, em qualquer situação, cerca de 80% do “trabalho” é feito por 20% dos participantes. Na maioria das sociedades, 20% dos criminosos cometem 80% dos crimes. Vinte por cento dos motoristas causam 80% de todos os acidentes. Vinte por cento dos bebedores de cerveja tomam 80% de toda a cerveja.

Agora em se tratando de epidemias, entretanto, essa desproporcionalidade é ainda maior: uma porcentagem mínima de pessoas faz a maior parte do estrago.

Pesquisas anteriores de pandemias que examinaram as pessoas que procuravam clínicas de saúde públicas para se tratar da doença no período de seis meses de um surto indicou que cerca da metade de todos os casos vinha, essencialmente, de poucos locais ou de poucos agentes que representavam em torno de 6% da área geográfica da cidade. Metade desses 6%, por sua vez, frequentava locais com aglomeração ou ambientes de riscos como hospitais e postos de saúde.

São os que fazem a epidemia crescer – os que estavam passando a doença para duas, três, quatro e cinco outras pessoas.  Em outras palavras numa população superior a 100 mil habitantes –, a epidemia sofre uma virada em consequência das atividades de poucas pessoas que viviam em alguns poucos lugares e que frequentavam alguns poucos locais de riscos.

Identificar essas pessoas (centro de atividades) é chave para o combate a disseminação.

Com as epidemias sociais é exatamente esse processo que ocorre. A Regra dos Eleitos diz que é porque um tipo de pessoas excepcionais possui a tendência, por meio de seus contatos sociais, disseminar o vírus por toda a parte.

Outros exemplos. Originalmente, as doenças de infecção aguda, podem ser tratadas rapidamente antes que tenham chance de gerar infecções muitas outras pessoas.

Imaginemos que depois, por causa de problemas de orçamento, a prefeitura decidiu fazer cortes graduais. Assim o número de profissionais da área médica foi então reduzido.  A quantidade de consultas caiu consideravelmente diante da tensão da demanda e a escassez de recursos. Ocorreu também uma diminuição semelhante do número de pessoas que trabalhavam no atendimento externo, diante da pressão e do aumento de contágio perante as condições inadequadas de atendimento. Havia muita política – coisas que antes eram comuns, como upgrades de computadores, deixaram de ser feitas. Manutenção de equipamentos, a limpeza e tantos outros serviços de apoio essenciais para as respostas a pandemia deixaram de dar respostas adequadas a demanda. O setor de compra foi incapaz de dar a manutenção necessária do estoque de remédios e insumos. Os remédios faltaram. Os números de óbitos aumentam consideravelmente e os cadáveres se amontoam, colapsa também os serviços funerários. Doentes infectados sem o devido tratamento e isolamento amplificam a disseminação do vírus, o contágio e o caos se estabelece.

Enfim, tratar todos agentes da rede de disseminação dos vírus como iguais é um grande equívoco e com consequências terríveis numa pandemia.

Imaginemos um outro cenário. Uma simples redução de cuidadores e profissionais da saúde, por exemplo, que pode transformar qualquer infecção contagiosa em uma moléstia crônica ou até mesmo em uma pandemia, de modo que seus portadores podem passar a ter de três a cinco vezes mais tempo para transmiti-la. Isso nos leva a outra regra o importante fator de fixação.

 

2. O Fator de Fixação

Uma das questões chave para esse é um princípio, bem conhecido em virologia, ou seja, quando alguma coisa altera o próprio agente epidêmico aumentando seu tempo de fixação. O agente infecioso muta e as pessoas continuam com o vírus. O vírus se fixa.

As cepas virais que circulam numa epidemia de gripe, por exemplo, no início do inverno são bem diferentes das que circulam no fim dessa estação. A mais famosa de todas – a pandemia de 1918, a chamada gripe espanhola – foi identificada na primavera daquele ano e era, relativamente falando, bastante fraca. Entretanto, durante o verão, o vírus sofreu alguma estranha mutação e, nos seis meses seguintes, acabou matando de 20 a 40 milhões de pessoas em todo o mundo. Nada mudou na maneira como o vírus estava sendo transmitido. Mas, de repente, ele se tornou muito mais letal.

Esse mesmo tipo de transformação drástica aconteceu com o HIV. Aconteceu muito com pneumonia por Pneumocystis jirovecii[2] em aidéticos (antes conhecido como Pneumocystis carinii[3]). Todos nós somos portadores desse microrganismo provavelmente desde que nascemos ou o contraímos logo depois. No caso da maioria das pessoas, ele é inofensivo. O sistema imunitário o domina sem dificuldades. No entanto, se o sistema é seriamente danificado por alguma coisa, como o HIV, esse microrganismo se torna incontrolável e é capaz de provocar uma forma letal de pneumonia. De fato, a pneumocistose é tão comum entre os pacientes de AIDS que já é vista como um indício quase certo da presença do vírus HIV.

Quando se estudou a fundo o HIV que circulavam na década de 1950 eram muito diferentes das de hoje. Eram tão contagiosas quanto as atuais. Mas fracas o suficiente para que a maioria das pessoas – até bebês – conseguissem combatê-las e sobrevivessem.  

No início da década de 1980 comunidades gays causaram a rápida propagação do vírus HIV no início da década de 1980, o que gerou muito preconceito, mas a epidemia também foi desencadeada porque o próprio HIV mudou. Por um motivo ou outro, o vírus ficou muito mais letal. Uma vez infectada, a pessoa permanecia infectada.

Essa ideia da importância da fixação no momento em que as coisas estão mudando tem enormes implicações na nossa maneira de ver as epidemias sociais também.

Perdemos muito tempo pensando em como fazer para que as mensagens se tornem mais contagiantes – em como alcançar o maior número possível de pessoas com nossos produtos ou ideias. Mas, quase sempre, o difícil na comunicação é descobrir como ter certeza de que a mensagem não vai entrar por um ouvido e sair pelo outro. Isso chamamos na comunicação de fixação. Não dá para tirá-la da cabeça. Ela gruda na memória.

O Fator de Fixação diz que há maneiras específicas de fazer com que uma mensagem contagiante se torne inesquecível – existem alterações relativamente simples na apresentação e na estruturação das informações que causam uma grande diferença na intensidade de seu impacto.

O mesmo acontece numa epidemia. A fixação é geradora de um impacto central.

Até agora, o SARS-COV-2 tem demonstrado pouca capacidade de mutação, mas ele, por exemplo, tem o agravante de gerar uma grande maioria de infectados que não apresentam sintomas da doença, mas continuam a serem vetores de disseminação do vírus. Um dos Centros de atividade desse vírus é a capacidade de localizar e monitorar os assintomáticos. Por isso a testagem em escala de senso é chave para o combate desse vírus.


3. O Poder do Contexto

 As epidemias, são muito influenciadas por sua situação – pelas circunstâncias, condições e particularidades dos ambientes em que ocorrem. Aqui, o dado geográfico, a monitoração em tempo real da circulação dos vértices, das arestas, dos caminhos do contágio na rede epidêmica é vital.  Além do atributo geográfico do dado, em tempo real o monitoramento do clima é vital para o combate na maioria das epidemias e, em todas as de SARS.

O efeito sazonal sobre o número de casos é tão forte que é fácil imaginar que bastaria um inverno prolongado e intenso para retardar ou diminuir de modo substancial – pelo menos durante uma estação – o crescimento da epidemia. O frio favorece o vírus num corpo com um sistema imunológico estressado.  O inverno aponta que os males estão a caminho. Nos meses de inverno, o mapa muda de aparência. Os ambientes de fecham, o oxigênio puro circula menos que o contaminado com as partículas virulentas. Por outro lado, o calor favorece a aglomeração. As pessoas ficam mais afoitas a saírem, aglomerarem em bares, praças e ambientes públicos favorecendo o contágio.

Não são apenas elementos evidentes, como a temperatura, que influenciam o comportamento. A emergência global das redes sociais também geram mudanças mais ou menos sutis e com inesperados fatores podem afetar a nossa maneira de agir. A redes sociais, trouxe em escala global a proliferação da fabricação e dificuldade de controle sobre notícias falsas que imprimem comportamentos de riscos, bem como, a politização e ideologização do vírus enfraquecem as medidas sanitárias seguras.  

Quando se vive cercado e pressionado por milhões de pessoas na rede, é quase uma questão de sobrevivência psicológica impedir que elas fiquem interferindo em sua vida o tempo todo, e a única maneira de conseguir isso são ignorá-las sempre que possível.

Esse é o tipo de explicação relativa ao ambiente que, para nós, intuitivamente, faz sentido. O anonimato e a alienação que marcam a vida nos grandes centros urbanos tornam as pessoas duras e insensíveis. 

Na verdade trata-se aqui do princípio da conformidade. A conformidade se refere aqui na dificuldade de manter nossas crenças diante dos outros. Trata-se da relação com o outro e nossa incessante busca de aprovação, de aplausos. Todos precisamos de aceitação. É muito difícil aplicar a máxima de Robert Lee Frost um dos mais importantes poetas dos Estados Unidos do século. Frost disse: "Duas estradas seguiam diferentes rumos num bosque. Peguei a menos movimentada. Isso fez toda a diferença!

O dilema da conformidade gera uma cobrança subjetiva permanente de reconhecimento. Um medo intenso de não ser aceito, de não ser conforme o reconhecimento dos aplausos do público que o cerca. Inspirafo por Rosnai autor do Homem Simbiótico afirmo que os seres humanos quanto mais se complexificam menos aptos se tornam para resolver os problemas coletivos complexos que eles mesmos criam. Diferentemente das formigas, que se comportam como geniais agentes coletivos e profundas idiotas individuais, os humanos estão se transformando em geniais agentes individualizados e cada vez mais um profundo idiota coletivo.

O fordismo nos transformou em geniais agentes coletivos e imbecis individuais. As redes sociais estão nos transformando em geniais agentes individuais e um perfeito idiota coletivo.

A questão que as redes sociais nos impõe é que se é possível fabricarmos, socialmente, a subjetividade?

Antigamente, a memória viva de um indivíduo estava limitada ao patrimônio de suas experiências diretas e a um reduzido repertório de imagens refletidas pela cultura; a possibilidade de dar forma a mitos pessoais nascia do modo pelo qual os fragmentos dessa memória combinavam-se entre si, em abordagens inesperadas e sugestivas.

Agora diariamente vivemos e assistimos um assalto à nossa subjetividade. Inicialmente, realizado por fora de nossas mentes. Máquinas de modular subjetividades pasteurizam ideias, criam vontades desejantes e produzem novas, desmoronando com o mito da subjetividade dada. A subjetividade dada é, cada vez mais, transformada num complexo processamento de co-auto- modulação simbiótica.

O que está sendo reservado, no presente e no futuro, para a "civilização da imagem?” Já afirmei na virada do milênio de que a nossa civilização intensificará, cada vez mais, uma reprodução mimética, ampliada de si mesma, transformando-nos em seres, também, cada vez mais simbólicos, inundados por um dilúvio de imagens pré-fabricadas.

Em todos os lados em que olho, encontro máquinas sensórias que capturam o real e o processam em codificação determinando pela captura as constituintes de novas espessuras vitais.

Inaugura-se, assim, a fabricação social da subjetividade. Nossos territórios existenciais são plugados nessas ondas precárias; surfamos em ondas eletrônicas de uma mobilidade generalizada nas músicas, nas modas, nos slogans publicitários, nos filmes, no circuito informático e telecomunicacional. O que não é captado pela malha virtual é encarado como se não existisse para o mundo. Habitamos ondas e velocidades em vez de lugares. Como nos alertou Ítalo Calvino: a velocidade reduz as distâncias, “abole as perspectivas e a profundidade da nossa moderna experiência sensorial que era baseada na cognição existencial”. [4]

A chave para conseguir mudar o comportamento das pessoas, isto é, fazer com que elas se preocupem com um vizinho que está necessitando de socorro, às vezes está em detalhes mínimos de sua situação imediata. O Poder do Contexto diz que os seres humanos são muito mais sensíveis ao seu ambiente do que pode parecer.

 Por fim, as três regras do Ponto da Virada, do desequilíbrio de Gladwell  – a Regra dos Eleitos, o Fator de Fixação e o Poder do Contexto – são uma forma de compreender as epidemias.



[1] Richard Koch, O Princípio 80/20. Rio de Janeiro: Rocco, 2000

[2] Pneumocystis jirovecii é uma espécie de fungo, semelhante à levedura, que pertence ao gênero Pneumocystis. O organismo é um importante patógeno humano, pois é causador de pneumonia, particularmente entre os hospedeiros imunocomprometidos, como as portadoras do vírus HIV.

A pneumonia por Pneumocystis carinii, também designada de pneumocistose, é uma das infecções oportunistas mais frequentes nas pessoas infectadas com o VIH. Qual é a diferença do HIV e aids. Não se trata de sinônimos. HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) é o vírus causador da aids, que ataca células específicas do sistema imunológico (os linfócitos T-CD4+), responsáveis por defender o organismo contra doenças. VIH é a sigla para Vírus da Imunodeficiência Humana. HIV é a sigla em inglês para Human Immunodeficiency Virus. SIDA significa Síndrome da Imunodeficiência Humana Adquirida. Na verdade, são diagnósticos diferentes – a infeção por VIH pode conduzir a uma doença ou síndrome, condição conhecida como SIDA.

O VIH é um virus e a SIDA é a condição que pode decorrer da infeção por esse virus. Assim, pode ter-se uma infeção por VIH sem aquirir SIDA, sendo muitas as pessoas com infeção por VIH que vivem durante anos sem desenvolver SIDA. A SIDA ocorre quando o VIH condiciona danos importantes ou severos na imunidade (sistema imunológico) e é uma condição complexa com sintomas que variam de doente para doente. Os sintomas da SIDA estão relacionados com as infeções que um doente pode apresentar como consequência de um sistema imunológico debilitado e, consequentemente, incapaz de combater outras infeções, ao contrário do que acontece em pessoas saudáveis. Estas podem incluir a tuberculose, a pneumonia, outras infeções e, ainda, certos tipos de neoplasias (cancro).

 [4] CALVINO, Ítalo. Seis Propostas para o próximo milênio. São Paulo: Cia das letras, 1990.  p. 45-67.


quarta-feira, 16 de setembro de 2020

O Planeta com Febre Alta

Gilson Lima

Desde  Gaia, Geia ou Gé (em grego: Γαία, transl.: Gaía), a mitologia grega, nos mostra a Mãe-Terra como um ente integrado.

  O primeiro a entender e indicar de modo  macro e mais sistemático a vida enquanto Planeta Vivo - pelo que sei - foi Leonardo da Vinci. No entanto, foi a abordagem de Lynn Margulis  descrita no livro: O planeta simbiótico - Uma nova perspectiva da evolução que se ampliou a consciência dessa perspectiva.





Esse livro feito para que o público leigo possa se inteirar da nova onda gerou ainda mais intensamente uma silenciosa revolução que aconteceu no meio acadêmico mundial.

A visão simbiótica aponta e atira, preferencialmente, contra o dogmatismo acadêmico.
A Biologia sofreu abalos em seus mais profundos alicerces. O epicentro deste terremoto pode ser descrito em uma palavra - simbiose. Por causa dela estão sendo revistas à genética, a evolução celular e as explicações científicas para a origem da vida.
Nosso Planeta é simbiótico. Não é só uma formação rochosa inorgânica. É vivo. Com todo um macro sistema de proteção a fragilidade da vida (atmosfera, etc...).

Hoje, sabemos mais precisamente quando a vida apareceu na superfície da Terra, mas como surgiu essa pequena película complexa em nosso planeta, ainda é um evento coberto de muitos mistérios. É do conhecimento da ciência que a vida existente hoje, tenha começado há cerca de 3,5 bilhões de anos. No entanto já foram encontrados estruturas microcelulares, com tamanhos e formas de bactérias modernas em rochas sedimentares com 3,8 bilhões de anos de idade. Então, parece razoável supor que a vida já existia nessa época.  Na escala geológica, esta é uma faixa bem estreita – de 200 a 500 milhões de anos, no máximo.

Tomemos, pois, como referência que a vida tenha começa há 3,5 bilhões de anos, com seres unicelulares que se assemelham a bactérias e algas, e chega à arrebatadora diversidade de formas vivas atuais, incluindo nós. A Terra é apenas um bilhão de anos, mais velha do que os primeiros registros de vida já descobertos. Se compararmos a idade da Terra à de um homem de sessenta anos, veremos que a vida surgiu rapidamente em nosso planeta. O tempo que foi necessário para que a vida aparecesse da Terra pode ser comparado com o tempo que um ser humano demora para atingir hoje a adolescência.

A vida sem cooperação de longo agora não evolui (simbiogênese). Não estamos cooperando nada com nosso Planeta vivo. Ele está com febre. Agravou ainda mais quando o padrão de consumo ocidental está se universalizando com China, Índia,... 

Nos tornamos ainda mais uma bactéria antibiótica, patogênica para  o planeta..

Imagine o que o Planeta fará para combater a febre.
Nosso futuro? De um longo agora?.... Será Vênus? Será uma Lua?  Temos esse "poder" de aniquilar a vida? Ao contrário, nossa mediocridade bárbara e predadora está nos levando ao suicídio, mas não da vida, mas de nossa espécie.
A metáfora da febre criei a partir da visão de Matrix de um lado a turma da técnicociência transformando nossa espécie em mera bateria orgânica (vida)  para Androides e sistemas maquínicos e cibernéticos assimbióticos e não numa diração para uma espécie evoluída de mesclados cyborgues simbióticos.  

De outro a catástrofe da queima do estoque de oxigênio por motores, máquinas e mecanismos de combustão em escala planetária nesse padrão de  moderno consumo industrial. 
O predador não evoluído é como bactérias patogênicas que atacam a cooperação da nossa rede simbiótica e, no caso, da rede simbiótica do Planeta.. Infeções, febres e efeitos colaterais são consequências de um planeta febril.

Qual o futuro de um LONGO AGORA da nossa espécie em proliferação predadora?

No esforço de tentativa de dar uma amplitude a simbiogênese como uma teoria social que tenho feito, defendo que é preciso enfrentar algumas noções ainda limitadas e submersas da ecologia, em teorias do desenvolvimento (com adjetivo de ser ou não sustentado, etc.).

 Não precisamos de desenvolvimento, mas de reciclar nossa relação com o planeta. É preciso enfrentar também a noção de meio ambiente.  O symbios (quando a vida acontece no mundo) acontece junto sempre com o mundo. Não existe um meio ambiente lá e um "sujeito racional" aqui. Estamos dentro. Fazemos parte da rede simbiótica em cooperação ou conflito.  

As abordagens de muitas tribos primitivas eram simbiogênicas. Um dos conceitos tribais de homem branco era: "aquele que caga na água que bebe". 

Antes de derrubarem uma árvore eles colhiam os galhos podres.....  O homem "racional" desenvolvimentista acredita que o meio ambiente seja apenas recursos ilimitados para seus interesses egocêntricos. É o tal de humanismo. O homem emoldurado em si mesmo.

Não somos humanos, somos uma espécie simbiótica complexa em transformação permanente. Estamos como estamos (humanos - se somos) por estarmos agora e não por que somos ou seremos. Não fomos antes e nem serremos "humanos" no futuro. O ponto de mutação do salto civilizatório não é tecnológico e ou do conhecimento, mas quando rompermos com a gênese do predador e voltarmos a complexidade de nossa inteligência para a cooperação com a rede da vida planetária num LONGO AGORA. É isso ou o suicídio da espécie mais complexa e inteligente que esse planeta já acolheu - até agora.