quinta-feira, 26 de maio de 2011

O FUTURO PRESENTE NA APRENDIZAGEM: a inteligência da complexidade

O FUTURO PRESENTE NA APRENDIZAGEM:  a inteligência da complexidade





A ciência, sobretudo, com o processo de aceleração tecnológica das últimas décadas, transformou o conhecimento em conhecimento complexo. Os paradigmas da aprendizagem estarão cada vez mais mergulhados na busca e reflexão e na experimentação do conhecimento complexo.
Gilson Lima



Ainda hoje em nossas escolas continuamos a formar pelas cidades afora, especialistas em disciplinas predeterminadas, portanto artificialmente delimitadas, enquanto uma grande parte das atividades sociais e do conhecimento científico, no presente e cada vez mais no futuro, tem e terão como exigência seres capazes de um ângulo de visão muito ampla e, ao mesmo tempo, capazes de inserir-se num enfoque de circunstâncias problemas em profundidade, além de altas habilidades de transgredirem as fronteiras históricas das disciplinas.
Os desenvolvimentos disciplinares das ciências trouxeram as vantagens
da produtividade quantitativa pela divisão do trabalho intelectual, mas também nos trouxe os inconvenientes da superespecialização, do confinamento e do despedaçamento do saber. Podemos dizer até que o conhecimento progride cada vez mais não tanto por sofisticação, formalização e abstração, mas, principalmente, pela capacidade de contextualizar e englobar (MORIN, Edgar, 2000).  

Efetivamente, a inteligência que só sabe separar, fragmenta o complexo do mundo em pedaços separados, fraciona os problemas, unidimensionaliza o multidimensional, elimina a visão a longo prazo. Sua insuficiência para tratar nossos problemas contemporâneos mais graves constitui um dos mais graves problemas que enfrentamos.

Nos diz Morin (foto ao lado), pensar a complexidade - esse é o maior desafio do pensamento contemporâneo e, para isso necessitamos de uma reforma no nosso modo de pensar (MORIN, Edgar &; LE MOIGNE, Jean-Louis. 2000 15-16).  De modo que, quanto mais os problemas se tornam multidimensionais, sem a reforma no nosso modo de pensar, maior a nossa incapacidade de pensar sua multidimensionalidade; quanto mais a crise progride, mais progride a incapacidade de pensar a crise; quanto mais planetários tornam-se os problemas, menos compreensíveis eles se tornam.
Porém, nós que fomos formados e deformados pelo saber disciplinar, fragmentado e segmentado impotente para uma perspectiva integrativa devemos nos conscientizar que cada vez mais nossos estudantes viverão num mundo onde a multipresença e maleabilidade serão princípios básicos constitutivos das suas relações sociais sejam essas relações sociais realizadas com rosto sejam elas realizadas sem rosto. Projeta-se que em 2015, será possível fazer contato com qualquer pessoa em qualquer ponto do planeta, através de minicelulares, sensores ligados a pequenos artefatos e redes computacionais sem dar um passo sequer. As pessoas teleaprenderão, teletrabalharão e se teledivertirão. Isto pode implicar no risco de ficarem abstratas demais e afetivamente e emocionalmente imaturas em demasia devido à falta de contato e vivência presencial com seus semelhantes.
Assim, desde agora a educação escolar deve contribuir para prepara-los a uma familiaridade equilibrada com os instrumentos de comunicação virtuais no compartilhamento de processos de produção de conhecimento por simulação e com o amadurecimento das suas potencialidades sensíveis e afetivas. Isso implica na inadequação, cada vez mais ampla, profunda e grave entre os saberes separados, fragmentados, compartimentados entre disciplinas, e, por outro lado, realidades ou problemas cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais, transnacioniais, globais, planetários.
Há uma última questão a considerar, particularmente relevante. O surto vertiginoso das transformações tecnológicas não apenas abala a percepção do tempo: ele também obscurece as referências do espaço. Foi esse o efeito que levou a compartilhar do conceito de “hipercórtex”, ou seja, do fenômeno da ampliação vertiginosa de nossa subjetividade cada vez mais espelhada e cada vez mais compartilhadas por interações com máquinas lógicas e artefatos sensórios, isso implica que vivemos cada vez numa densa malha de conectividade, onde os processos que até ontem eram monopólio da mente humana como lógica e cognição, por exemplo, agora estão interligados e integrados às mentes humanas cada vez mais em redes de comunicações e informações envolvendo o conjunto do planeta, onde tudo cada vez mais se torna uma coisa só, uma grande e poderosa “montanha russa” (SEVCENKO, Nicolau, 2001).
Um fato é inegável o de que as mudanças tecnológicas, embora causando vários desequilíbrios nas sociedades mais desenvolvidas que as encabeçam, também canalizam para elas os maiores benefícios. As demais sociedades são arrastadas de roldão nessa torrente, ao custo da desestabilização de suas estruturas e instituições, da exploração predatória de seus recursos naturais e do aprofundamento drástico de suas já graves desigualdades e injustiças.
Por detrás do desafio da complexidade, esconde-se um outro desafio: o da expansão descontrolada do saber. O crescimento ininterrupto dos conhecimentos constrói uma gigantesca torre de Babel, que murmura linguagens discordantes. A torre nos domina porque não podemos dominar nossos conhecimentos. T. S. Eliot dizia: Onde está o conhecimento que perdemos na informação?” (MORIN, Edgar, 2000:16). O conhecimento só é conhecimento enquanto organização, relacionado com as informações e inserido no contexto destas. As informações constituem parcelas dispersas de saber.
Em toda parte, nas ciências como nas mídias, estamos afogados em informações. O especialista da disciplina mais restrita não chega sequer a tomar conhecimento das informações concernentes a sua área. Cada vez mais, a gigantesca proliferação de conhecimentos escapa ao controle humano. Daí o sentido da segunda questão de Eliot: “Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento?  (MORIN, Egar, 2000: 17).

Os conhecimentos fragmentados só servem para usos técnicos também segmentados e separados da aculturação. Não conseguem conjugar-se para alimentar um pensamento capaz de considerar a situação humana no âmago da vida, na terra, no mundo, e de enfrentar os grandes desafios de nossa época. A persistir isso, não conseguiremos integrar nossos conhecimentos para a condução de nossas vidas.

Gilson Lima Prefossor da UNISC - Universidade de Santa Cruz do Sul. Brazil. Sociólogo da Ciência – Pesquisador do Research Committee of the Clinical Sociology Association International Sociological (ISA).E-mail: gilima@gmail.com Blog: http://glolima.blogspot.com/


REFERÊNCIAS:
LIMA, Gilson. Nômades de Pedra: teoria da sociedade simbiogênica. Porto Alegre: Escritos/TomoEditorial: 2005.
MORIN, Edgar. A Cabeça bem feita: repensar a reforma e reformar o pensamento. Rio de Janeiro: Bertrand, 2000:15-16.
Ver MORIN, Edgar & LE MOIGNE, Jean-Louis. “A Inteligência da Complexidade”. São Paulo: Peirópolis, 2000.
Sobre a metáfora da montanha russa como explicação didática da aceleração tecnológica ver: SEVCENKO, Nicolau. “A CORRIDA PARA O SÉCULO XXI: no loop da montanha-russa”. Rio de Janeiro: Companhia das letras, 2001.
Idem, MORIN. 2000:16.
Idem, MORIN: 2000: 17. A idéia de sabedoria provém do sabor, do sabor prazeroso de degustarmos um apetitoso cardápio de conhecimento. A busca da sabedoria está envolta a um plasma do prazer, do insigth, da curiosidade do e no conhecer e nos impõe desafios para uma pedagogia não centrada na disciplina, não colonizada pelo controle de uma ordem racional, mas uma pedagogia da imaginação criativa e aplicada à complexidade cada vez mais crescente da nossa civilização planetária.

3 comentários:

Henrique disse...

Professor Gilson, fantástico este seu texto, concordo plenamente com estas afirmações mescladas de conhecimentos próprios mesclados com o de grandes intelectuais como Morin, e Morin citou um poeta também T.S Eliot, muito bom mesmo meus parabéns. Lerei este texto na reuniã pedagógica na escola em que faço estágio.

Henrique Veber

Henrique disse...

Professor Gilson, fantástico o texto tanto pelos seus raciocínios muito lúcidos, como por esse diálogo com Edgar Morin, que inclusive citou um poeta T.S Eliot. Lerei seu texto na reunião pegagógica da escola em que faço estágio. Parabéns!!!

Anônimo disse...

Parabéns pelo artigo. O confinamento do saber de que falas, fez-me pensar no artigo de Deleuze - "Michel Tournier e o Mundo sem Outrem"- sobre o livro de Michel Tournier, institulado "Sexta-feira ou os limbos do pacífico" , que lê segundo seu modo a desventura de Robson Crusoé de Daniel Defoe. Para Delezeu Robinson Crusoé era um típico perverso, muito embora não tivesse qualquer comportamento perverso. Isso porque sua estrutura psíquica não mais era marcada pelo rastro da presennça de outrem. Daí que Deleuze dirá que, ao faltar outrem na nossa experiência, passamos a representar o outro de modo absoluto, de forma que, consequentemente, estará reduzido a uma relação perversa. O outro sempre será vítima, elemento, cúmplice, etc. Nunca outrem. Nunca sujeito.
Quando tu falas de uma ampliação vetiginosa de nossa subjetividade, eu penso que isso pode dizer respeito ao uso de mecanismos tecnológicos afastados da sensibilidade. Ou seja, estaríamos de certo modo como corpos acoplados à máquina tecnologia, no entato não alcançaríamos a própria subjetividade que nos constitui como seres humanos.
Lacan falaria em sujeito do significnate, mas essa é outra história...
Excelente artigo, abraços, David Leal.